quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

orelha edu



edu me convidou a escrever esta orelha quando em mesa de bar comemorávamos meu aniversário, duas ocorrências que beiram o nonsense mas dialogam com a realidade, logo, combinam com ele e este novo livro.
depois de os primeiros escritos alçarem voos em leves calopsitas líricas e irônicas, eduardo silveira apresenta a nós, leitores, versos-poemas densos e maduros, agora conduzidos por um animal de hábitos predominantemente terrestres e mais pesado. isto porque os textos deste “tamanduá/bandeiras” versam, de repente, sobre personagens que comem tijolos e políticos a dormirem de sapatos, ou seja, é necessário ao animal da vez saber suportar as desgraças históricas, o enfado do trabalho diário e inclusive as notícias bonitas.
com este livro, edu nos convida a aceitarmos a imaginação como parte do mundo, de maneira próxima à que ele consegue, ao carregar na cabeça os próprios mapas: políticos, cotidianos, líricos e satíricos. e é pelo viés literário o convite de edu para aturarmos por exemplo a burrice e aquele-que-não-pode-ser-nomeado, sinônimos que, sem metáforas, são impossíveis de tolerarmos.
o que edu quer com estes poemas, também, é encontrar um lugar do caralho pra amar o amor possível – na faixa de gaza, nas repartições públicas, num beliche – e, para isso, ele extrai da linguagem o prazer e milita a favor do cerne da carne e contrário aos toscos bons costumes. depois, ainda, edu descansa a língua da linguagem e escolhe palavras com cuidado, capacidade restrita a poucos poetas, o que configura a singularidade desse escritor por quem sou amor da cabeça aos pés.

ítalo puccini