quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Sentir com o personagem


    A leitura de "Sinuca embaixo d'água", da gaúcha Carol Bensimon (Companhia das letras, 2009), trouxe-me à lembrança a leitura de "O gato diz adeus", do Michel Laub, que por sua vez me remeteu a outras leituras (aqui).
    O romance de Carol não segue a linha de troca de cartas entre os personagens, mas poderia ser. Cabe ao leitor escolher como o lerá, uma vez que esta estrutura de romance 'fragmentado' - em que os capítulos são curtos e com vozes narrativas diferentes - recorrente em muitas produções literárias atuais, permite ainda mais estes múltiplos caminhos de leitura pelos quais o leitor pode transitar.
     Durante a leitura deste livro, fiquei procurando a(s) voz(es) que conduzia(m) o romance. Isto porque o fato de os capítulos terem como título os nomes dos personagens, em um primeiro momento me levou a lê-los como se fosse cada personagem narrando uma parte da história, com suas vozes narrativas se misturando, e com essa impressão-leitora segui adiante. Mas por muitos momentos sentindo que havia apenas uma voz narrando tudo e às vezes, no meio dos parágrafos, como que migalhas de pão lançadas ao leitor para lembrar o caminho da história, resquícios de vozes dos personagens. 
     Personagens estes abalados demais com a morte de uma personagem que não tem voz no romance, Antônia, mas que se torna o centro de toda a história, pelo fato que lhe acontece antes mesmo do começo do livro, parece ao leitor, que é sua morte em um acidente de carro. É a partir das vozes de pessoas muito próximas a Antônia, que sentem muito sua perda, que o romance se constrói. É a partir deste cruzar de dizeres e sentires - de ausências - que o leitor vai tomando corpo junto à história, aos detalhes muito bem encaixados na narrativa pela autora. A narração do livro parece conduzir o leitor para sentir como sentem os personagens Bernardo, Camilo, Polaco, entre outros. Como se pudesse, o leitor, entrar no corpo, na vida deles. E, sabemos, através da leitura isto é algo muito possível.
    Carol Bensimon é autora de "Pó de parede" (Não Editora, 2008), um livro também dividido, mas não um romance, e sim composto por três histórias diferentes entrei si (aqui). Nos dois livros é possível encontrar um domínio narrativo, uma escrita com um ritmo bastante próprio, que conduz o leitor por caminhos vários dentro da história, transitando pelos personagens e por seus sentires. 
    Neste seu mais recente trabalho, a escrita também repleta de referências artísticas e sociais - contemporâneas e clássicas - apresente, com eficiência, um romance que exige do leitor um gesto de liberdade em não apontar soluções fáceis que aparentemente o texto apresenta, mas sim em estar aberto e atento à narração da(s) história(s) contada(s), sob risco de perder algum fato ou alguma fala que dá luz ao mesmo.

Ítalo Puccini

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

aforismo


toda criança é uma ausência de horário.


ítalo puccini