E
eu o vi de perto. De muito perto. Coisa de dois metros de distância. Quase
colado à grade da pista do Pepsi On Stage, em Porto Alegre, na terça-feira 24
de abril. Por uma hora e cinquenta minutos ele esteve à minha frente. E começou
cantando Leopard-Skin Pill-Box Hat, do
disco Blonde on Blonde - assim como fizera nas outras apresentações nesta
recente passagem pelo país – emendando com o hit It's All Over Now, Baby Blue.
E na terceira música já veio a gaita de boca. Você não acredita que aquele som
exista até que o ouça ao vivo. Você não acredita que aquela pessoa exista até
que você a veja com os seus próprios olhos.
Não
paro de ouvi-lo já faz muito tempo. Anos e anos. Ouvindo e lendo sobre o ser
extremamente tímido e por isso misterioso que pouco se deixa mostrar pela
mídia. Inclusive levei o livro autobiográfico “Crônicas – Volume um” para meus
alunos do Terceirão, em determinada aula, e foram meses até ele voltar a mim.
Uma boa meia dúzia passou a conhecer um pouco mais da vida de Bob, algo que
muito me alegrou, imagina senão.
(Abrindo um parêntese: Porto Alegre é cidade grandimais.
E suja demais. Acolheadora, pareceu-me. Bati perna, conheci a ‘Casa do Mário”
(Casa de Cultura Mário Quintana) e o aeroporto Salgado Filho (este porque
ficava em frente ao local do show). Além do próprio Pepsi On Stage, da
rodoviária e de alguns ônibus e táxi’s. Aliás, só em Porto Alegre eu vi um
Váxi, uma vaca instalada no meio da rodoviária, com a plaquinha com tal nome
sobre ela. Não me perguntem o que significa. Bom, isso tudo meras impressões de
quem passou breves 24h por lá).
Voltando a falar sobre o ser de cabelo-cacheado-parecido-com-o-meu,
e de voz rouca, o que não faltaram foram descontração e empolgação: dos fãs,
obviamente, da banda, e do próprio Dylan, desmistificando o mito de que não
interage com o público. O homem arriscou passinhos de blues, risos tímidos,
brincadeiras com os músicos, e até fingiu passar mal, levando por vezes a mão à
nuca, fazendo caretas de cansaço e de falta de ar. Vai que é a idade, né? Mas
prefiro a ideia de que ele fingiu, de que o bom humor era tanto que até brincou
com o público – e com os próprios músicos que faziam expressões de susto e não
desgrudavam os olhos dele nesse momento. Pareceu-me tão bem ensaiado quanto a
execução das músicas.
Seis
dias depois, assisti a um show d’ O Rappa, em Camboriú. E os caras merecem
algumas linhas aqui, sim. (Prometo voltar à Literatura na semana que vem. Já
chega de futebol e música, eu sei, leitor). Coisa bonita de se viver é um show
de uma banda ou de um músico de que você gosta – às vezes até de quem você não
conhece muito. A energia compartilhada num local e num momento como estes é
inigualável. São sensações e lembranças que se guardam pro resto da vida, sem
dúvida. E não sei bem o porquê de estar escrevendo esta crônica, afinal,
somente vivendo um show para senti-lo como realmente foi. Mas eu acredito nas palavras
e na possibilidade de troca de sentires entre autor e leitor. Enfim, a
‘quebradeira’ proporcionada pelo Rappa foi ducaraleo! Não havia como não pular
ensandecidamente, numa mesma vibração, num mesmo tom de voz: o grito. Duas
horas e meia de show, roupa encharcada, pernas e braços doloridos, rouquidão, e
uma leveza mais eficiente do que a eterna mania de descansar (vulgo, ficar
parado).
Uma
áurea mítica com o Dylan, um silêncio que precede o esporro com O Rappa.
Independente do estilo musical, quando se curte e se está disposto a tal, um
show ressignifica muito umas milhares de vidas.
With God On Our Side, Valeu a pena, êê.
Ítalo Puccini
Ítalo Puccini