segunda-feira, 5 de março de 2012

Crônica para o meu pai

           Meu pai tem me lido semanalmente, uma vez que tenho publicado crônicas em sites e jornais há alguns meses já. E ele não tem gostado do que escrevo, não. Gostou de uma só. Tou em dívida com o velho. Sendo assim, resolvi escrever esta crônica especialmente para ele, pedindo licença aos leitores que aqui buscam referências e ladainhas literárias (sim, porque toda crônica me parece ser uma ladainha – mas isto é assunto pr’outra crônica).
        Recentemente, ele tirou sarro da minha escrita sobre como os ônibus são progenitores de crônicas, além de não ter entendido nada sobre uma outra crônica, anterior, que tratava da prática da leitura, sobre quando algo faz ou não faz sentido a quem o lê. Pois então, escrevo a ele para confabularmos (e os leitores estão convidados) sobre o ato de lavar louça. (Um assunto muito cronicável, não é mesmo, pai?).
         Em algumas conversas de bar com amigos, vezemquando citamos o ato de lavar louça como uma forma de terapia. Edu foi além, disse que mais importante do que tal ação é a música que se ouve enquanto se pratica este ritual (afinal de contas, uma tarefa executada diariamente pode ser chamada de ritual, né? Creio que sim). Tem razão o Edu. Hoje mesmo, antes de me sentar diante do computador para escrevinhar este e outros textos, lavei a louça ao som da trilha sonora do filme “Across the universe”. A mãe, que estava na cozinha naquela hora, odiou. Pedi a ela que se retirasse, claro. E em três músicas a louça estava devidamente lavada.
        (E enxugada, mas enxugar a louça acredito que seja uma das coisas mais inúteis que as pessoas fazem. Basta deixá-la secando sozinha. Fica até melhor, sem aqueles fiapos de pano nos pratos, nos copos ou nos talheres. Lavo a louça com orgulho, mas me recuso a secá-la).
         Voltando à louça como terapia, o que tu achas, pai? Lembro-me de ti lavando louça e ouvindo as notícias no rádio – geralmente esportivas. Ou lavando a louça e conversando com alguém. Inclusive, deixando acumular louça, para que o serviço valesse à pena. É uma boa tática. Agora que estou morando sozinho, tenho feito isto. Poucas coisas são tão prazerosas quanto receber a visita de alguém e conversar enquanto se ‘limpa a pia’ (eufemismo pobre, eu sei).
         Também tem aquela situação de a visita se prontificar a lavar a louça na sua casa. Um ato educado, sem dúvida, mas exagerado. E às vezes não há nem o que fazer, pois a pessoa faz questão de se molhar na sua pia. Eu não faço isso na casa dos outros, não. E evito deixar que façam na minha. Cada um com suas louças, cada um com seus problemas. Prefiro, realmente, que me façam companhia pr’uma prosa num ambiente tão acolhedor quanto é a cozinha.
      Sendo assim, estão todos convidados a isto. Próximo almoço, ou próxima janta, formalizarei os convites. Inclusive ao meu pai.

Ítalo Puccini